2 de janeiro de 2011

David Mourão-Ferreira, Gaivotas em Terra

“Gaivotas em Terra”, livro vencedor do Prémio Ricardo Malheiros, da Academia das Ciências de Lisboa em 1959, é o conjunto de quatro novelas (“Tal e Qual o Que Era”, “E aos Costumes Disse Nada”, “Casal Venha Lisboa” e “Agora o Fado Corrido”), escritas nos anos cinquenta por David Mourão-Ferreira (1927-1996), poeta, crítico, novelista e contista, ensaísta e dramaturgo, para além de ter assumido alguns cargos no governo e em diversos institutos e imprensa nacional, e que marcou a sua escrita por um humor mordaz e uma ironia certeira, sendo estas novelas disso um bom exemplo.
Os textos - que como sugerido por vários críticos ao longo das décadas seguintes e assumido também pelo próprio autor, se poderia ter constituído como um romance ou pelo menos um seu esboço, mas que no fim se quedaram como novelas autónomas - têm em comum vários aspectos e é isso mesmo que lhe dá a unidade referida em cima: a personagem central é uma mulher ou é o tema central da relação do homem com a mulher; são novelas urbanas cujo pano de fundo é Lisboa numa celebração e homenagem à cidade “menina e moça” retratada no poema de Ary dos Santos, aos seus recantos, hábitos, cores e cheiros de vários bairros; e são escritos numa linguagem própria usando por vezes as personagens alguns termos chocarreiros e outros uma linguagem de certa burguesia que ainda sobrevive em determinados centros urbanos.
As novelas foram escritas, como se escreveu em cima, nos anos cinquenta, num tempo em que não se vivia tão depressa, mas que mantêm em certos traços a mesma actualidade e uma frescura por vezes surpreendente. No fim de contas, o país não pode ter mudado assim tanto em sessenta anos. Para o bem, para o mal, e no que aos brandos costumes diz respeito.
Li pela primeira vez este livro (Editorial Presença, 9ªedição, 1998) há pouco mais de dez anos e voltei a relê-lo agora no final deste ano que passou. Aconselho que continue a ser lido, especialmente pelas novas gerações a quem os livros portugueses do século XX pouco vão dizendo, a não ser que estejam inscritos num qualquer programa de ensino.

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